Em julgamento realizado na quarta-feira, 24, o STF firmou entendimento que a responsabilidade pelo dano ambiental é imprescritível, ou seja, não existe um prazo máximo para se exigir que o dano seja reparado, em sendo identificado, poder-se-á pleitear reparação, inclusive de quem estiver na cadeia sucessória.
Ou seja, não há limite de prazo para se exigir a reparação civil pelo dano ambiental causado, ficando o Poder Judiciário com direito perpétuo de cobrar responsabilidade, inclusive usando toda a cadeia sucessória empresarial daqueles responsáveis pelo ato poluidor.
Ação de 1980
A decisão foi dada numa ação que discutia o dano causado por madeireiros na exploração de terras indígenas no Acre, nos anos 1980, e na qual se buscava valer da tese da prescritibilidade do crime, para não serem condenados.
O processo fundava-se na seguinte questão central: deveria prevalecer o entendimento de beneficiar o causador do dano, dada a inércia do Estado, que demorou para buscar a responsabilização do agente, ou deveria prevalecer os princípios constitucionais de proteção, preservação e reparação do meio ambiente, que beneficiam toda a coletividade, sem prazo prescricional, ou seja, aquele que limita o tempo para mover uma ação.
Os ministros entenderam que deveria prevalecer a proteção dos bens difusos e coletivos.
A regra geral do direito é da prescrição, ou seja, todas as ações têm um prazo para serem movidas no tempo. A imprescritibilidade é uma exceção, mas necessária.
Patrimônio da humanidade
O meio ambiente deve ser considerado patrimônio comum de toda humanidade e para a garantia de sua integral proteção, especialmente em relação às gerações futuras, todas as medidas devem ser tomadas, inclusive, as mais restritivas em direitos exclusivos e unilaterais e mais abrangentes em obrigações.
Foi assim então que os ministros do STF, por maioria, decidiram que
“a reparação do dano ao meio ambiente é direito fundamental indisponível, sendo imperativo o reconhecimento da imprescritibilidade no que toca à recomposição dos danos ambientais”, tendo sido fixada a seguinte tese: “É imprescritível a pretensão de reparação civil de dano ambiental”.
Com isso a decisão do STF pacifica o debate na jurisprudência e coloca uma pá de cal na questão.
Os ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Marco Aurélio divergiram da tese proposta e ficaram vencidos.
Mas o que isso representa na prática?
Primeiramente, a decisão pode trazer impacto para toda a cadeia sucessória empresarial dos responsáveis pelo ato poluidor, danificador do meio ambiente.
Assim, para fins de apuração do nexo de causalidade no dano ambiental, equiparam-se quem faz, quem não faz quando deveria fazer, quem deixa fazer, quem não se importa que façam, quem financia para que façam, quem se beneficia quando outros fazem ou quem venha a se beneficiar futuramente.
Supomos que uma empresa prejudique o meio ambiente, mas antes que seja descoberto o dano, o agente causador faleça e venha a ser sucedido ou a empresa é vendida para outros sócios. Mais tarde, quando o dano for constatado, poderá ser pleiteada a obrigação de reparar o dano, por exemplo, reflorestar uma área, ou uma compensação financeira, seja do novo “dono”, seja ao herdeiro ou sucessor, não se podendo alegar que o tempo passou e foi perdida a oportunidade de cobrar, ou alegar que não tenha agido com dolo ou culpa, ou mesmo alegar que não foi quem praticou o ato.
Segundo, em caso de grandes desastres, a ausência de prazo para acionar o Poder Judiciário, se mostra extremamente importante e abre uma grande margem temporal para o gerenciamento e fiscalização dessas áreas a longo prazo. Por vezes, há danos que só aparecem ao longo do prazo e a outros que só podem ser constatados ao longo do tempo.
Por exemplo, como saber se a área foi reflorestada corretamente ou o rio despoluído, se não se aguardar o tempo necessário para mostrar essa realidade?
Ou, como saber se os efeitos de um agrotóxico lançado numa área grande não afetaram o lençol freático ou se não afetou alguma espécie que, somente, no futuro, poderá se perceber o real impacto no meio ambiente ou na cadeia alimentar dos animais envolvidos naquele sistema.
Por vezes, a verificação e percepção dos danos a longo prazo, permite um melhor equacionamento das medidas necessárias de reparação. Assim, tornar imprescritível, sem prazo, a possibilidade de cobrar a reparação do dano, alcança não só os danos já ocorridos, mas também danos futuros que venham a ocorrer na sequência e pelas mesmas razões.
Com essa decisão, o STF aponta para uma robusta e clara sinalização contrária à impunidade pelos danos ambientais que assolam os mais diversos ecossistemas do país. Mais do que isso, por se tratar de um caso de desmatamento ilegal, de madeireiros em terra indígena, a tese fixada pela Corte Suprema reforça com contundência o combate ao desmatamento ilegal que persiste em acontecer na Amazônia Legal, com aumento considerável nestes últimos tempos.
Com certeza essa decisão vai trazer um impacto muito significativo principalmente na cultura do cidadão ou empresário que ainda guarda o sentimento de que com o passar do tempo, as “responsabilidades” serão perdoadas ou esquecidas.
Parabéns ao STF. Acesse AQUI o acórdão.
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